Tornou-se comum ter como resultado de um diagnóstico da cultura de segurança de uma organização um nível de maturidade dependente na gestão de segurança com alguns poucos aspectos de cultura independente. Para entender melhor e saber o que se deve buscar, mostro a seguir as características desse tipo de cultura em segurança: independente.
A importância dada a segurança não é o desafio
A consciência da importância de um sistema de gestão de segurança bem implementado e ativo já não é mais um desafio. Ao longo de anos, a implementação de sistemas de gestão de segurança corporativos ou regrados por padrões internacionais como a OHSAS18001, mostrou para os gestores o resultado efetivo que práticas como a Política de Segurança, DDS, Gestão de Terceiros, Análise de Risco de Tarefa, Permissão de Trabalho, Gestão de EPI, Bloqueio de Energias Perigosas, investimentos para adequações legais e muitas outras trazem para a organização. São benefícios percebidos em relação à custos médicos, imagem organizacional, impacto social, relacionamento com sindicatos, produtividade e etc. Ou seja, falar que a gestão de segurança é importante não é mais tão necessário, apesar de, às vezes, ser necessário dar pequenos lembretes com campanhas pontuais.
Pessoas reconhecidas
Começar a ocorrer episódios de reconhecimentos individuais. Algumas pessoas que contribuíram ativamente para a redução dos acidentes começam a ser reconhecidas com certificados, diplomas e, eventualmente, prêmios simbólicos. Essa valorização da contribuição individual está vinculada à iniciativas de aplicação do DDS, emissão de relatos de condições inseguras, participação na realização de SIPAT, atuação diferenciada na CIPA, disciplina no uso de ferramentas e equipamentos e outras posturas individuais que a equipe de segurança ou os gestores entendem como sendo de grande contribuição para a organização. É nesse momento que todos percebem como o reconhecimento positivo pode alavancar o desempenho em segurança e começam a pensar em formas de fazer isso de maneira sistêmica, regular e normatizada.
Segurança percebida como um processo organizacional
Áreas que antes não se envolviam com a gestão de segurança começam a perceber a sua extensão. A área de compras inclui requisitos para fornecedores em seu manual de contratação, a área de engenharia chama a equipe de segurança para discutir futuros investimentos, equipe comercial de vendas começa a envolver o cliente em demandas de ergonomia relacionadas à especificações de clientes como peso do sacarias, o líder da equipe de segurança começa a participar das reuniões estratégicas e PCP da operação, entre outras iniciativas. Em resumo, a área de segurança começa a ser vista como detentora de um processo que precisa se integrar com os demais processos da organização.
Conhecer as melhores práticas
Faz parte da rotina da equipe de segurança e dos gestores visitar outras unidades operacionais da mesma empresa e outras empresas para assimilarem boas práticas a gestão de segurança para aplicar na própria operação. Em função do maior envolvimento com as processos e ferramentas de gestão de segurança por parte dos gestores, a demanda por melhorias na aplicação dos métodos passar a ser mais incisivo e isso leva as pessoas a desejarem ver como outras empresas executam a rotina de segurança do trabalho. Eventualmente, operadores e cipeiros também acompanham essas visitas de boas práticas. Também se torna usual a contratação de treinamentos externos relacionados a ferramentas comportamentais para líderes e equipe de segurança, momento em que fazem novos contatos para suas redes profissionais.
Conflitos fazem parte da organização. Briga, não.
Conflitos fazem parte da gestão de qualquer organização, pois o esforço para melhorar e evoluir implica, necessariamente, em diferenças de opiniões colocadas sobre a mesa. Em uma cultura de maturidade independente na gestão de segurança, esses conflitos não perpetuam e são resolvidos de maneira madura, considerando fatos, dados e o cuidado com o compromisso de manter bons relacionamentos e um clima organizacional receptivo a novas ideias, sugestões, inovação, contribuições e relações amistosas. O exercício da vaidade nesses conflitos em função da posição hierárquica é visto como algo indesejado, apesar de aparecer, mesmo que raramente.
Desempenho não é só taxa de frequência.
O desempenho em segurança do trabalho começa a ser percebido como uma ferramenta de gestão e não como uma forma de medir a taxa de frequência de acidentes. Alguns indicadores proativos começam a entrar no leque de indicadores de gestão estratégica da organização e passam a ser estratificados por área, gerando uma competição interna sadia e construtiva. Indicadores como horas de treinamento, emissão de relatos de desvios, resolução de ações de acidentes, aderência às inspeções, realização de simulados e outros começam a ser reportados a todos. Competições intituladas “Rally da Segurança” se tornam mecanismos de reconhecimentos de área e individual em função da medição dos indicadores proativos. Enfim, o desempenho de segurança começa a ser visto muito além das taxas de acidentes.
Disciplina e confiança devem ser construídas.
A disciplina operacional passa a ser vista como uma característica definida por aspectos de gestão e não como algo inerente ao ser humano, ou seja, não é mais vista como uma característica pessoal desabonadora. A disciplina operacional passa a ser trabalhada a partir da ênfase em comunicação, treinamentos e do engajamento gerencial. Com isso, o estímulo a partir da possibilidade de punição não é algo praticado de forma tão corriqueira.
Uma consequência da característica anterior é o fato de todos terem clareza em relação ao que é esperado dentro de sua função e a atuação conforme essa expectativa e as suas obrigações se torna natural. É comum, nesse momento, dedicar esforços na implementação da ferramenta de Recusa de Tarefa de maneira corporativa, ou seja, motivada pelos líderes e formalizada nos padrões de segurança.
Finalmente, o Cuidado Ativo.
Em resumo, a partir da análise de todas essas características, uma conclusão natural é a de que a consciência para o cuidado com a vida das pessoas e o tema segurança do trabalho atinge um patamar elevado.
Ainda assim, os esforços para o cuidado ativo pleno ainda são grandes e é algo que será atingido apenas num nível de interdependência, isto é, aquele momento em que eu cuido de mim, eu cuido do outro e permito que cuidem de mim. Isso acontece pelo entendimento de que o desempenho pessoal só é bom quando o desempenho de todos é bom, que todos percebem que não adianta apenas a própria área ter bons processos, todas as áreas precisam atingir o mesmo nível de excelência.