Na década de 1980, meu pai fez um curso sobre Qualidade Total na extinta estatal Telesp que depois foi adquirida por uma multinacional espanhola no processo de privatização da telefonia. Falar sobre qualidade em uma estatal que tinha monopólio de um ramo de atividade, a telefonia, parece engraçado. E é, de fato. Por que se preocupar com qualidade quando seu cliente não tem opção?
Não é razoável imaginar que a qualidade da qual desfrutamos hoje em muitos serviços seja fruto da preocupação de empresários conscientes da sua importância para os consumidores. A qualidade é fruto da concorrência, da necessidade de sobreviver das empresas em um mercado competitivo para que seus donos e/ou acionistas recebam seus dividendos.
Muitas organizações estão naquela fase da “Qualidade Total” quando falamos de Segurança do Trabalho. Ainda usam o discurso da Vida como valor, da segurança ser uma prioridade, do Acidente Zero e dos 1000 dias sem acidente. A Vida já é um valor para as pessoas, não é preciso convencê-las disso. Acidente Zero é sobre pessoas, não sobre métricas. Acidente Zero deveria significar que os esforços estão direcionados para que ninguém se machuque e não para que não ocorram afastamentos. Quando se comemora 1000 dias sem acidentes, pode ser que você esteja batendo palmas para a sorte, para o acaso ou para a probabilidade.
Algumas organizações diferenciadas já perceberam que cuidar da integridade física e mental dos seus empregados é, mais do que um diferencial competitivo, o mínimo a ser feito, assim como a qualidade nos dias atuais.
Em 2008 eu trabalhei em uma empresa que tinha dificuldades para contratar novos operadores de produção porque, apesar do salário alto para a época, cerca de R$2.000,00, os riscos envolvidos eram altíssimos. Os candidatos desistiam durante o processo de entrevistas quando conheciam a área ou desistiam do emprego após algumas semanas. Apesar do salário e de bons benefícios, muitos novos contratados não aceitavam se expor a tais riscos.
A pergunta que fica é a seguinte: jovens que hoje estão na faixa de 15 a 18 anos aceitarão trabalhar em uma empresa que não tem a segurança como uma prioridade além do discurso e não se mostra visível nas ações e decisões? Minha opinião: NÃO. Segurança, nesse momento, passará a ser o mínimo a ser feito e não mais um diferencial.
Quando esse dia chegar – e esse dia não está longe - o engajamento no cuidado com as pessoas não será mais uma competência “core”, mas uma competência mínima para a empregabilidade de líderes. Até lá, profissionais da área de segurança terão que gastar muita saliva e dedicar esforços hercúleos para manter o leme na direção correta.